segunda-feira, 29 de março de 2010

INSTRUMENTO DO MEU CANTO

Lá pelos idos anos 1980, pouco mais da metade dessa década, creio eu, 1986 pra tentar ser exato, caso não me traia minha aflita memória, assisti a um show do cantor e compositor pernambucano Geraldo Azevedo, este acompanhado apenasmente de seu violão, e saí do Garfo Clube, na Ilha, local daquela apresentação de gala, como quem tivesse ido a um banquete de arte, tamanha era minha indômita fome de vomitar versos. E, em casa, como quem cumpre uma necessidade fisiológica, despejei-me no raso prato do papel em branco, borrado à tinta e fingimento:

Meu instrumento é a melhor ferramenta,
Som que ele produz conduz meu pensamento
Por intensa caminhada calma e violenta:
Aonde a canção alcança o sacramento.

Meu instrumento é a melhor vestimenta,
Com ele me sinto (lindo!) invadindo o infinito.
Todo o Universo o sol bemol contenta
Quando acorda os acordes mansos do grito.

Meu instrumento é o que me alimenta,
Com ele transformo fome e fúria em canto.
Preparo em paz a melodia que sustenta
O corpo e dá à alma sopro e acalanto.

Meu instrumento é o que me inventa,
Com ele te descubro ò Deus do meu talento,
Certeza que só o coração experimenta:
__ Música é o altar do sentimento!

(Pedro Ramúcio)

27 comentários:

  1. Muito legal, bela inspiração. Versos como esses dá vontade mesmo de vomitar, cantar, gritar, recitar alto e em bom tom.

    Beijos pra ti

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  2. Luciana (xará da musa-esposa),
    Palavras de pessoas feito você, dá vontade de mastigar, ouvir, ingerir, deglutir, comer, sorver, escutar, repetir... e sempre querer mais, pois saciam a sede da alma.
    É um banquete de signos merecer você aqui!

    Abraço mineiro,
    Pedro Ramúcio.

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  3. O seu instrumento é sua escrita, tão bonita assim.

    Imagino que o show deva ter sido um máximo mesmo, o cara é bom!

    Beijo, boa semana.

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  4. Lara,
    Um show que me ficou guardado na memória e no bordado dos versos pelas agulhas do tempo.
    O instrumento de quem escreve é a saudade, às vezes até do footuro.

    Boa semana a ti também,
    Pedro Ramúcio.

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  5. Gostava de fazer poemas assim com essa simplicidade com que tu fazes....
    Beijo

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  6. Mag,
    Uma vez cometi um poeminha que diz assim:

    "Suponha-se a rima feliz,
    E a dor de quem a cria?
    Psiu! Palavras são armas vis,
    Disse-me certa vez uma cotovia."

    Sim, mas a simplicidade é o resumo de uma arte: seja um golo de Pelé, um quadro de Picasso, uma pintura de Dali, um poema de Camões, um discurso de Abraão Lincoln, um verso branco de Walt Whitman, um pensador de Rodin, um Davi de Michelângelo, uma fotografia de Campanella, uma crônica de Roberto Lima, um drible de Garrincha, um acorde de João Gilberto, uma canção de Pablo Milanês, um comentário de Magnólia...

    Abraço na simplicidade,
    Pedro Ramúcio.

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  7. Inclinações musicais
    Geraldo e Renato Rocha

    Quem inventou o amor
    Teve certamente inclinações musicais

    Quantas canções parecidas
    E tão desiguais
    Como as coisas da vida
    Coisas que são parecidas
    Feito impressões digitais
    No violão esta mesma subida
    Na voz a rima de sempre
    Coração essa mesma batida
    Que bate tão diferente
    Quando acontece na gente
    O mesmo amor
    É um amor diferente demais
    Quem inventou o amor
    Teve certamente inclinações musicais

    Essa canção muito me marcou e como você diz "Música é o altar do sentimento". meu abraço.

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  8. Assis,
    "Quem inventou o amor?
    Responda por favor."
    Já quisera saber, sem sucesso nem resposta, o poeta Renato Russo.
    E "Inclinações Musicais", essa lindíssima canção trazida aqui por você, poeta de luz e estrelas, certamente responde um pouco do que procurara saber vosso colega.
    E há mesmo canções que nos marcam muito, Assis. É como se o pequeno ponteiro do tempo parasse um instante, quando elas tocam de novo: trilhas de uma saudade. E essa que trouxeste pra enfeitar o Canto Geral, é tão delicada e suave que já a ouço a ressoar num cantinho de minha memória, amigo...

    Abraço e obrigado pela visita,
    Pedro Ramúcio.

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  9. És um poeta Pedro... tens alma de poeta...
    Beijo

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  10. você, ramúcio, sempre generoso e gentil.
    fico todo encabulado quando vc me oferece seus buquês.

    falando agora em geraldinho azevedo e Inclinações Musicais (mencionado aqui), esse foi um disco que me marcou muito.

    daí, dois causos curtos:

    um: certa tarde eu estava tomando uma cerveja com wildmark (lembra dele no democrata?) e joãozinho, o balarino da toca, num bar de framingham, nas cercanias de boston,onde G.A. realizaria um show voz-violão, à noite.

    o cantor apareceu e ficamos um tempão proseando,esperando a passagem de som. nesse papo
    falei com ele que minha canção favorita de seu repertório, era uma canção esta que ele jamais havia cantado em show, o que ele confirmaria.

    nesse papo, fiquei sabendo que a contra-capa do lp Inclinações Musicais - simulando uma "vitrine" de loja de discos -, foi feita a partir da coleção de LPs da coleção do jornalista sérgio cabral (pai do atual governador do rio e parente da então mulher de geraldinho... aliás... que coleção!

    geraldinho pediu que ficássemos para o show e ficamos, até bem de noitão (só deu tempo de ir ao hotel tomar um banho)... nem deu tempo de melhorar da ressaca... emendamos uma bebedeira na outra...

    e foi assim que ganhei de presente, a lindíssima Coqueiros, que ele cantou no show e a dedicou a mim.

    foi um dos melhores presentes que já ganhei na vida.

    wildmark e joãozinho ficaram se roendo de inveja e me obrigaram a pagar a conta...rs

    paguei com prazer.

    Dois: alguns anos depois eu viria a produzir uma turnê de geraldinho pela costa leste dos EUA.

    e foi igualmente especial.

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  11. Mag,
    Não imaginas a alegria que sinto em merecer-te aqui. Tu, poeta de pétalas em forma de tapetes...

    Abraço de muita estima,
    Pedro Ramúcio.

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  12. Roberto,
    Os buquês são porque amo você, poeta.
    E Geraldo Azevedo tem uma doçura no canto (agora tá tocando Berekerê, enquanto teclo no piano do computador) e uma leveza na voz, que vou às nuvens sempre que o ouço. Sem dizer do seu violão de mil cordas, né!
    Lembro do Wildmark no Democrata, sim. E Joãozinho, como esquecer? Nem eu nem o Edinho do Fluminense, e tantos outros defensores que cruzaram pelo caminho do Bailarino da Toca. Prodigioso ponta-esquerda, Delima.
    E adoro seus causos. E por falar em Sérgio Cabral, vi-o anteontem na TV falando sobre o último vôo do Armando Nogueira, por sobre as nuvens densas do infinito, onde ainda não chega nossa míope imaginação. E tenho tentado rabiscar umas linhas pro Mestre, mas meus pequenos ponteiros do tempo estão muito ocupados das faturas dos zapatos que revendo diariamente, pra defender o teto e o prato de cada dia. Vai aqui um trechinho, não ainda do meu contento:

    Armando Nogueira, gênio
    Da ginga e jogo de olhares
    Lançados da arquibancada
    Como quem entra em campo.
    E com os poetas da bola,
    Que escrevem com os pés,
    Ele tabelava com as mãos,
    Fazendo versos de viés.

    *

    Seu fã de montão,
    Da rama.

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  13. rapaz, nem me fale em armando nogueira...

    minha admiração por sua lucidez (e poesia nos textos) me deixavam voando, como os ultraleves que ele gostava de pilotar...

    que o ar lhe seja leve, ramúcio.

    abração do
    roberto.

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  14. Que o ar lhe seja leve, Armando Nogueira, como as crônicas que você pintava...

    Abraço, Roberto.

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  15. Lindo por aqui.
    Vim conhecer.. fiquei.
    Passa la pra conhecer meu canto.
    Bjins entre sonhos e delírios

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  16. Tudo aqui é mais que lindo,
    é um ES-PE-TÁ-CU-LO
    e nós espectadores privilegiados!
    Vim desejar a ti e aos teus, uma feliz páscoa e votos de renovação e ratificação da vida.
    Um abraço e meu carinho,

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  17. Reflexo,
    Já fui lá banhar-me um pouquinho dos teus sonhos e delírios e deixei um poemeto remoto meu por lá. Convidou, eu fui com a memória a tiracolo. Estarei sempre...


    Até as próximas,
    Pedro Ramúcio.

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  18. Laurinha,
    Tudo aqui é mais que simples, amiguinha meiga minha, e o espetáculo está nas visitas que recebo feito as tuas.

    Feliz Páscoa,
    Pedro Ramúcio.

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  19. Ei!
    Mineiro é?
    Tambem sou!
    Mas anota meu email e manda
    um email pra la pra eu guardar o teu
    catiaho@hotmail.com

    Adorei que aceitou o convite
    ´passa aqui tambem :http://meusreflexoscontostextoseafins.blogspot.com/
    Bjins sonhos e delírios

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  20. Geraldo é mestre, impossível não tê-lo como inspiração.

    Gostei do escrito: Música é o altar do sentimento!

    De fato, é!
    beijos =*

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  21. Reflexo d Alma,
    É! Mineiro como Drummond, Rosa, Adélia, JK, Santos Dumont, Tiradentes e vosmecê.
    Lá passarei, lá passarei também em seus reflexoscontostextoseafins...

    Abraço valadarense,
    Pedro Ramúcio.

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  22. Deliciei-me com a música; lambi os dedos no poema; mas foi com os diálogos entre ti e Roberto que lambi o prato (ainda bem que ninguém estava a ver).

    Um abraço, Pedro!

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  23. Jorge,
    O Roberto é craque com as palavras, nasceu para o ofício oral e escrito delas, e, em sendo assim, calha tão fácil e grácil dialogar com ele, como o é contigo também. Trialoguemos, pois, poeta.
    A propósito, eu já sentia falta de ti e tuas palavras aqui, amigo.
    Aliás, o fado é mais leve quando elevamo-nos na amizade. Achegue-se sempre mais, Seu Jorge...

    Abraço amigo,
    Pedro Ramúcio.

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  24. Pois cá estou, sempre, Amigo Pedro!
    Um grande abraço!

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  25. Jorge,
    A mim só me cabe agradecer-te essa honraria maior que é a de merecer-te sempre aqui, sabes!

    Feliz Páscoa,
    Pedro Ramúcio.

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  26. "música altar do sentimento" reverenciar as notas, o tom, o canto, o movimento que alquimicamente faz o meu corpo dançar, compreendendo a vida.

    Beijos,

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  27. Renata,
    As notas, o tom, o canto, o movimento, a alquimia, a dança: o corpo compreendendo a vida, a alma apreendendo a lira...

    Abraço de Minas,
    Pedro Ramúcio.

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