quinta-feira, 26 de agosto de 2010

VELHO CORAÇÃO DE POETA

Vez por outra ouço aqui e acolá que o bardo baiano, o grande Caetano Veloso, não é mais o mesmo. Num domingo desses, por exemplo, o Fagner disse no programa "Conexão Roberto D'Ávila", pela TV Brasil, que o pai da Tropicália hoje escreve pouco e fala muito...
Será que o Sr. Caetano Emanuel Vianna Telles Veloso é bananeira que já deu cachos (e que cachos!)?
Será que 'menopausa' - menor pausa - dá em poetas?
Da minha parte tenho também Tanta Saudade de Chico Buarque!

Eu não posso mais certas rimas
Fui poeta mil anos atrás
Agora canto torto, saudade ensina
A glória é uma camisa-de-força

Por força do hábito inda sonho
Estrelas caídas no chão
Hora vivo o verso de ontem
Hoje acordo sem acordes na mão

Sou poeta por que fui poeta?
Página pede pela nova canção

Vou poeta porque fui poeta
Ainda é de trovas meu coração!

(Pedro Ramúcio)

domingo, 15 de agosto de 2010

GIRASSÓIS

































Por dizer de Picasso (e Pessoa tão presente em mim desde sempre) em resposta ao comentário da Dra. Vanessa Souza Moraes do "Meu divã é na cozinha" - blogue de rara lucidez - que me visitou na postagem última dedicada a Rodin
, lembrou-me estes versos que o poeta e compositor Samuel de Abreu in Sampa musicou com muito talento e competência (duas versões disponíveis no youtube).

Preciso a primeira página
Preciso Picasso, Pessoa e girassol
Preciso a virgem vermelha lágrima
Preciso o peixe, a pedra e o anzol.

Preciso a terceira margem
Preciso coragem, comida e girassol
Preciso viajar a última viagem
Preciso poesia, música e futebol.

Preciso a pílula e o elefante
Preciso a coruja, a noite e o girassol
Preciso amores eternos e diamantes
Passar a tarde inteira em teu lençol.

Preciso o cacto e a primavera
Preciso o vento, o vinho e o girassol
Preciso o pêssego, a morena e a quimera
Preciso a pétala íntima, manhã com sol.

(Dedicado ao professor, poeta e engenheiro AL-Chaer de Goiânia)

(Pedro Ramúcio)

domingo, 8 de agosto de 2010

ATELIER

Outro poeminha de mesma safra e colheita das metáforas anteriores.

Rodin esteve aqui
Não há braços nem pernas
Para se compor o poema
Apenas a meditação de uma lágrima
Caindo
Paralisada no ar

Ah! Rodin
Mais que o mármore
Esculpiste a alma

(Pedro Ramúcio)

domingo, 18 de julho de 2010

METÁFORAS DESAFORADAS

Olá, pessoal da pesada e da minha mais prezada apreciação. Estive - tive que estar - ausente do blogue por alguns intermináveis dias: uma cirurgia urgente que eu deveria ter realizado há uns dez anos, mas só no último 30 de junho criei asa e coragem para enfrentar o fio da navalha. Oxalá, correu tudo bem. Agora, minhas hemorreimas não são mais desculpas esfarrapadas (pimenta no dos outros é refresco, né!) para eu não trabalhar - ah! como dói -, não postar minhas 'maus' trançadas rimas, não viajar pela aí em busca de tertúlias fulgurantes, não ir mais vezes a Santo Amaro da Purificação - Vila do meu Feitiço -, não cumprir alguns compromissos tão simples e corriqueiros, nem outros pequenos poréns para além da minha mínima capacidade de persuasão poética...
Dos primeiros dias de recuperação, os mais 'inspira-dores', ofereço-lhes estes versos trazidos ao lume num dos momentos de grande gozo em que eu pude, literalmente, ver, ouvir e tocar estrelas na íntima Via Láctea que se tornou o banheiro por ocasião das minhas mais profundas meditações, se é que me entendem (rs)...

A dor é um orgasmo que não suportamos,
Espasmo da alma obtendo abster-se do corpo.
O prazer é um grito de quem está morto.
Morte? A melhor moradia que habitamos!

Alegria, alguma ilha ao Sul donde estamos.
Loucura seria achar a bússola e o barco
E volver a travessia fatal de um parto...
Porto seguro é a nuvem de que despencamos.

Pecado é o fruto maduro que não ofertamos!
Epicuro vertendo suas vestes aos céus,
Felicidade é a cidade dos tabaréus!

Aos sábios lhes baste a arte de serem bons!
Aos tolos lhes dêem outra tábua de dons!
Enquanto isso reinamos, remamos, teimamos...

(Dedicado a Frida Kahlo, quadros e esquadros em que me banho:
lagos lá em Nina Rizzi ou Adriana Calcanhoto)

(Pedro Ramúcio)

sábado, 26 de junho de 2010

DESRENATO BRAZ

Há artistas que são divisores de água, que partem o tempo ao meio, que estabelecem novas fronteiras (de paz!), que movem moinhos futuros, que descontroem muros de concreto mas erguem pontes imaginárias de luz (verdadeiros arcos-de-triunfo da humanidade), que são antenas da raça. Com sua religiosidade pacífica, pregando a não-violência, Gandhi foi um desses artistas. Com seu claro canto iluminador, Renato Braz pertence à espécie.

Quem faz assim com a voz

Põe é tudo ao contrário

O poeta salvo no calvário

O rio vai nascer na foz


Quem canta assim des’jeito

Põe é tudo arrevirado

O amor sem um pecado

O humano sem defeito


Quem lança um canto assim

Põe é tudo ponta-cabeça

O imponderável aconteça

O impossível tenha fim


Quem desfia assim uma canção

Põe é tudo detrás pra frente

O antigo de moda novamente

O moderno em liquidação


Quem traz assim o sol em si

Põe é tudo fora do trilho

O poente reluzente brilho

O breu se oriente aqui


(Dedicado ao músico valadarense Marcelo Novaes,
quem primeiro me disse de Renato Braz;
ao percussionista biquense Zé Bré, com quem simpatizei
à primeira vista: ele num programa do Boldrin,
eu em casa 'dando milho aos pombos';
ao poeta Roberto Lima, pra que a lista fique infinita...)

(Pedro Ramúcio)

sábado, 19 de junho de 2010

PONTO E VÍRGULA

Sabe aquelas vezes que você escreve em puro estado de febre, e, vãs, as palavras vão brotando involuntárias de suas mãos ávidas por descansar do dédalo que habita o teclado do computador? Estes estranhos e aninhados versos nasceram-me assim, baixados do céu ou levantados do chão, não sei ao certo, só sei que essa febre quando passa dá de novo...

Quanto tempo casto gasto pra fazer o verso

Que só faço quando lasso enlaço a lua?

Quantas rimas primas principio do precipício

Mas antes do fio o poema já chegou ao fim?

Quantos rostos toscos ponho face a face

Com o espelho do Evangelho e nasce um beijo?

Quantas palavras gastas no cio e no silêncio

Mas quando balbucio crio uma orgia de almas?

Quantas histórias desbotadas pela tinta da memória

Repinto num pedaço de papel de mim poeta?

Quantos músculos exaustos gesticulo e pulo

Por cima do mais alto muro que não cerca a poesia?

Quantos livros em branco arranco as páginas

E preencho com romances dignos de Dostoiévski?

Quantos títulos vitalícios invento sem intento

De me tornar autor de clássicos de qualquer espécie?

Quantas estrofes esquizofrênicas saltam dos meus dedos

Longos longe de eu ser uma Cecília Meireles?

Quantos cantos eternos, efêmeros ou meros

Alexandrinos miro sem a mira de um Dante ou Homero?

Quantos decassílabos esmiúço amiúde e jamais

Pude comparar-me um centímetro com Vitor Hugo?

Quantos heterônimos reais recriei ao meu redor

Fingindo para mim mesmo que eu paria Pessoas?

Paro aqui estas interrogações quase infinitas

E aborto o poema, ou repontuo-o de vãs exclamativas?


Quem me dera agora eu tivesse uma viola pra cantar!


(Dedicado a José Saramago,

que nos deixou dia 18 de junho último)


(Pedro Ramúcio)

sábado, 12 de junho de 2010

JANELA À LUA


Este pobre rabiscador de quimeras rende-se hoje no dia dos namorados todos os dias à sua musa-esposa-poeta-cantora numa cúmplice homenagem de amor e paixão.

Entre teu corpo e o meu
Foi posto o amor
Nenhum dos dois enlouqueceu
Ante o ciúme enlouquecedor...

Entre tua palma e a minha
Foi posta a paixão
Uma tão grande e a outra pequenininha
Nenhuma menor que o maior coração...

Entre teu beijo e o nosso
Foi posto o desejo
Viver de amor meu amor é tudo o que posso
Ancorar-me em teu corpo, único porto que vejo...

Entre nosso abraço e a lua
Foi posta a madrugada
Desço teu ventre e encontro, destrancada e nua
A janela da mulher que já é minha eterna namorada...

(Ramúcio Pedro)

quinta-feira, 10 de junho de 2010

FUTEGRAFIA













Em dias de Copa do Mundo, já que o mundo todo estará ligado no evento, posto aqui um sonetinho terçando sobre o esporte das multidões.

Gol é música muda, melodia
Que vemos da arquibancada, encantados.
Futebol! Épico de alva grafia,
Com rimas lidas nos passes trançados.

Posso ouvir, com olhos esverdeados
Que tenho, o que adia minha miopia:
Bola, a que o jogador, pelos gramados,
Firula entre os pés, tecer cantoria.

Ah! Dá na gente vontade de dançar
Quando se lembra dos gols do Pelé
E daqueles que ele marcou ao errar.

Cada drible do Garrincha eu sei que é
Um acorde de canção a ressoar
Em nosso ouvido colado em seu pé.


(Dedicado a Nelson Rodrigues, que via futebol
com os olhos da imaginação)


(Pedro Ramúcio)

sábado, 29 de maio de 2010

PASÁRGADA PERDIDA

Cismo que em algum lugar -
Nada se parece mais com um paraíso -
Existe uma Pasárgada perdida
Dando Bandeira pra mim.

(Dedicado a Nina Rizzi)

(Pedro Ramúcio)

quarta-feira, 12 de maio de 2010

"DRUMMOND(NIANAS)"













A deferência é uma das maiores formas de reverência, e vice-versa. Vide os versos do talentosíssimo poeta Assis Freitas, que transponho, feito um rio, leito de um São Francisco caudaloso de lirismo e redemoinhos poéticos (perigoso então ficar só nas margens da poesia, e isso lembra canção de Roberto Mendes, outro baiano genial: há que naufragar nessas águas do tempo, para assim se lavar melhor), vide os versos abaixo que deságuam lá do "mil e um poemas" aqui no Canto Geral. Banhem-se, amigos! Fartem-se com esse raro percurso pela obra oblíqua e reta de Drummond, desde Itabira até Feira de Santana:

I

o amor bate na aorta:

então é preciso sangrar


II

tenho leite e jornais

todos os dias

e alguma poesia


III

as cidades e os moinhos

ficam no meio do caminho


IV

não há idade madura

as palavras apodrecem

se não forem gastas


V

consigo rimar outono

com a pedra que sonho

com sono, não


VI

já nasci gauche

o anjo torto

não era pervertido


VII

preso as minhas roupas

e alguma classe

fico cinzento e sem pátria


VIII

sejamos pornográficos

o mundo não é vasto

o mundo parece doce

como soda, raimundo


IX

queria ter nascido

em Andradina

seria uma forma

fina de rima


X

não chores meu filho

ainda há versos que

não foram escritos


(Assis Freitas)

domingo, 25 de abril de 2010

POEMA nu BLOGUE




















"Este é o poema no blogue
por onde o poeta escuta
se dele falam mal
ou se o amam.
Um poema no blogue
sequioso de comentários?
São nenhum livro velho
e mais nem um livro novo
de um poeta inda mais louco
que a morte que sonhou
e contudo o provoca
a morrer nunca e sempre.
Tantos livros que a vida
empurrou para longe
de mim
mais um poema no blogue
em que o poeta se contempla
e se diz bom-dia
(ensaio de boa-tarde,
variante de boa-noite,
que tudo é a vasta noite
em seus compartimentos
nem sempre respiráveis
e todos habitados
enfim.)
Não me leias se buscas
flamante novidade
ou sopro do Pessoa.
Aquilo que escondo
e o mais que segue explícito
em negros alçapões
são notícias humanas,
simples estar-no-mundo
de um heterônimo-órfão,
um não-estar-estando,
mas de tal jeito urdidos
o roubo e a confissão
que nem distingo eu mesmo
o sentido e o solapado.
Tudo roubado? Nada.
Nada sentido? Tudo.
O blogue pouco cuida
de direitos autorais:
e a paródia mais rica
é um sinal de mais."

(Pedro Ramúcio sobre o Poema-Orelha de CDA)

domingo, 18 de abril de 2010

"PONTARIA"
























É com imensa, mais que imensa alegria, que posto aqui no Canto Geral um texto de Líria Porto, artista que eu venho descobrindo com o atraso de cem anos-luz de solidão, mas agora vou em busca do tempo perdido e do cheiro de Deus que habita esta poeta, artesã que me surpreende a cada poema dotado de leveza, graça e a fina ironia dos grandes pensadores, além do hábil traquejo com a palavra escrita, que lhe escorre da alma, percorre-lhe a palma e amalgama-se no papel sempre num tiro certeiro: verso que conversa com quem o lê, língua afiada e olho no olho. Que mais posso dizer de? Que mais? Que?
Dela, eu (es)colhi, posto que esse pequeno quintal da blogosfera destina-se a homenagear grandes artistas que comoveram o mundo (ou sua aldeia, o que dá no mesmo), hoje eu semeei no Canto Geral, trazido de 'tanto mar', um tantinho de palavras em intenção de um certo Bituca, mais conhecido como Mister Milton Nascimento. Um tantinho de palavras semeadas, mas que dão a dimensão do alcance e da 'pontaria' de Líria Porto: de Araguari para BH para Miami para Brasília para o mundo...

milton minério
nascimento pássaro
caçador de min(as)

(Líria Porto)

domingo, 11 de abril de 2010

HELOO, PAUL McCARTNEY





























Há alguns anos, ouvi pelo rádio, quando as Rádios brasileiras ainda tocavam os autênticos músicos brasileiros, a canção "Hello, Goodbye", dos Beatles, na voz do mineiro Milton Nascimento. E, paradoxalmente, aquela interpretação do Milton para uma canção estrangeira suscitou, em mim, imenso sentimento de brasilidade - sem falso ufanismo -, por saber que um artista nacional era capaz de impor sua marca única e pessoal ao registrar, de forma emocionada e comovedora, um grande sucesso mundial numa língua que não é a de seu povo, porém, ali tão bem representado em arte e engenho. Desde então, eu fiquei imaginando qual seria a reação do Paul McCartney quando ouvisse todo o talento do nosso Bituca (sem falso ufanismo ou xenofobia de qualquer espécie), mas fiquei delirando poder ver a cara do Paul ao ouvir sua obra ganhando tal manobra vocal.

Eu só queria ver a cara do Paul McCartney quando ouvisse

Cantando “Hello, Goodbye” o Milton Nascimento


Eu só queria, de repente, ver a cara dele quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “San Vicente”


Eu só queria, sábio sabiá, ver a cara dele quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “O Que será”


Eu só queria ver a cara do Paul McCartney quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “Travessia”


Eu só queria, por um triz, ver a cara dele quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “Beatriz”


Eu só queria, tão natural, ver a cara dele quando ouvisse

O Bituca cantando “Brasil, Nome de Vegetal”


Eu só queria ver a cara do Paul McCartney quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “Maria, Maria”


Eu só queria, por mil razões, ver a cara dele quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “Certas Canções”


Eu só queria, para emoldurar, ver a cara dele quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “Conversando no Bar”


Eu só queria ver a cara do Paul McCartney quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “Balé da Utopia”


Eu só queria, quem lhe dera, ver a cara dele quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “O Cio da Terra”


Eu só queria, morena menina, ver a cara dele quando ouvisse

Mister Milton Nascimento cantando “Clube da Esquina”


Eu só queria ver a cara do ex-beato Paul quando ouvisse

Cantando “Para Lennon e McCartney” Sir Milton Nascimento


(Pedro Ramúcio)

domingo, 4 de abril de 2010

UM PIANO PARA JOHN LENNON


Sempre logrei escrever algo para John Lennon

Sempre imaginei que ele fosse ouvir e gostar

De saber que um poeta qualquer dos trópicos

Do Sul

Sempre sonhou em fazê-lo música mineira

Sempre escutei Lennon na música mineira

Nas oitavas acima do Milton e nos acordes do Lô

No piano de Wagner Tiso e nas melodias do Beto Guedes

Nas cordas de Celso Adolfo e nos vôos mágicos do 14 Bis

Na mista récita do Aggeu Marques e nos falsetes de Venturini

Na guitarra de Toninho Horta e nas letras vibrantes de Brant

Nos versos que li do Vander Lee e no canto com que me espanto

Do Tadeu

Franco


Então comprei um piano, aluguei uma guitarra

Rabisquei umas rimas, imitei uns pássaros

Desaposentei meus óculos de trezentos graus

Meus óculos “redondos” de duzentos graus

Meus óculos antigos a verem navios e naus

Subi os degraus de nuvens nos fundos do quintal

De casa

(Ainda há um quintal nos fundos de casa)

E fui compondo este poeminha para minha

Homenagem a Lennon, eu e minhas mãos trêmulas

(Êmulas de si mesmas), para John Lennon

Eu e minhas pernas bambas, para John Lennon

Eu e meus pés descalços, para John Lennon

Eu e minhas asas partidas, para John Lennon

Eu e meus ouvidos ávidos, para John Lennon


Para John Lennon, minha roupa rasgada

Desvestindo a pele e as epidermes da alma

Para John Lennon, meu corpo marcado

No rosto, na sola, na palma e no sangue

Para John Lennon, meus olhos verdes

Ainda que maduros pelas noites em claro

Templos de solidão e lições de sobrevivência


John Lennon não sobreviveu ao tiro

À queima-roupa

John Lennon não ressuscitou à bala

De chumbo

John Lennon não soube morrer

De velhice


Mas John Lennon ainda está vivo

Nas canções

John Lennon renasce a cada solo

De guitarra

John Lennon ressurge em cada nota

De piano

Jonh Lennon revive em cada verso

Da juventude

Jonh Lennon comemora-se a cada

8 de dezembro


John Lennon mais que uma vela acesa

Tornou-se estrela no grande céu imaginário

Da minha constelação de diamantes


Ouça, John Lennon, o poeminha que lhe fiz

Com minhas mãos no piano mudo do teclado

Do computador

Onde guitarras solam “Imagine”

Onde cítaras citam “Imagine”

Onde banjos esbanjam “Imagine”


Ouça, John Lennon, meu coração batendo

Palmas em Dó Maior


(Pedro Ramúcio)

segunda-feira, 29 de março de 2010

INSTRUMENTO DO MEU CANTO

Lá pelos idos anos 1980, pouco mais da metade dessa década, creio eu, 1986 pra tentar ser exato, caso não me traia minha aflita memória, assisti a um show do cantor e compositor pernambucano Geraldo Azevedo, este acompanhado apenasmente de seu violão, e saí do Garfo Clube, na Ilha, local daquela apresentação de gala, como quem tivesse ido a um banquete de arte, tamanha era minha indômita fome de vomitar versos. E, em casa, como quem cumpre uma necessidade fisiológica, despejei-me no raso prato do papel em branco, borrado à tinta e fingimento:

Meu instrumento é a melhor ferramenta,
Som que ele produz conduz meu pensamento
Por intensa caminhada calma e violenta:
Aonde a canção alcança o sacramento.

Meu instrumento é a melhor vestimenta,
Com ele me sinto (lindo!) invadindo o infinito.
Todo o Universo o sol bemol contenta
Quando acorda os acordes mansos do grito.

Meu instrumento é o que me alimenta,
Com ele transformo fome e fúria em canto.
Preparo em paz a melodia que sustenta
O corpo e dá à alma sopro e acalanto.

Meu instrumento é o que me inventa,
Com ele te descubro ò Deus do meu talento,
Certeza que só o coração experimenta:
__ Música é o altar do sentimento!

(Pedro Ramúcio)

quinta-feira, 25 de março de 2010

"TODAS ELAS JUNTAS NUM SÓ SER"


Sabe aquelas 'pancadas' que você toma quando toma conhecimento da existência palpável - e audível - de certas obras-primas. Pois bem: estávamos indo pra Bahia, mais exatamente para Santo Amaro da Purificação, eu e Samuel de Abreu, no intuito de tentar conhecer Roberto Mendes, mago do violão. No meio da viagem, Samuca saca um CD do Lenine, põe pra tocar uma canção que eu ignaramente ainda não conhecia. E lá vou eu tomando aquela 'porrada' com a melodia, os versos e a interpretação ímpar do pernambucano arretado que só. Era "Todas Elas Juntas Num Só Ser", uma daquelas canções definitivas que nascem de cem em cem. Antes de chegarmos ao nosso destino, ainda mais uma pancadinha de leve: batemos o carro e saímos ilesos de um acidente considerado grave pelo guarda-rodoviário que já estava no local atendendo outra ocorrência grave (estradas brasileiras, aff!) e presenciou, incrédulo, toda a cinematográfica cena de dois caminhões sendo amassados por um valente Fiat Uno, que trazia a bordo dois dublês de compositores metidos a conquistar Roberto Mendes, o mago do violão. Obstinados, prosseguimos a viagem de ônibus e obtivemos a recompensa maior: o grande compositor baiano foi com a nossa alma e se fez nosso amigo num encontro que mais pareceu o reencontro de velhos conhecidos que se reviam depois de tempos. Tudo devidamente ciceroneado pelo guia cultural Robério, o Grego. E eu ainda fiquei no lucro maior (apesar das perdas e, danem-se os danos materiais...), por trazer na algibeira, além da amizade à primeira vista do mago do violão Roberto Caribé Mendes, esta canção que, se eu tivesse, daria mais mil veículos 1000, pra durarem exatos dois mil quilômetros, mas trazendo na bagagem de minha memória das águas "Todas Elas Juntas Num Só Ser".

Não canto mais Babete nem Domingas
Nem Xica nem Tereza, de Ben jor;
Nem Drão nem Flora, do baiano Gil;
Nem Ana nem Luiza, do maior;
Já não homenageio Januária,
Joana, Ana, Bárbara, de Chico;
Nem Yoko, a nipônica de Lennon;
Nem a cabocla, de Tinoco e de Tonico;
Nem a tigreza nem a vera gata
Nem a branquinha, de Caetano;
Nem mesmo a linda flor de Luiz Gonzaga,
Rosinha, do sertão pernambucano;
Nem Risoflora, a flor de Chico Science,
Nenhuma continua nos meus planos.
Nem Kátia Flávia, de Fausto Fawcett;
Nem Anna Júlia do Los Hermanos.

Só você,
Hoje eu canto só você;
Só você,
Que eu quero porque quero, por querer.

Não canto de Melô pérola negra;
De Brown e Hebert, uma brasileira;
De Ari, nem a baiana nem Maria,
Nem a Iaiá também, nem minha faceira;
De Dorival, nem Dora nem Marina
Nem a morena de Itapoã;
Divina garota de Ipanema,
Nem Iracema, de Adoniran.
De Jackson do Pandeiro, nem Cremilda;
De Michael Jackson, nem a Billie Jean;
De Jimi Hendrix, nem a doce Angel;
Nem Ângela nem Lígia, de Jobim;
Nem Lia, Lily Braun nem Beatriz,
Das doze deusas de Edu e Chico;
Até das trinta Leilas de Donato,
E de Layla, de Clapton, eu abdico.

Só você,
Canto e toco só você;
Só você,
Que nem você ninguém mais pode haver.

Nem a namoradinha de um amigo
E nem a amada amante de Roberto;
E nem Michelle-me-belle, do beattle Paul;
Nem Isabel - Bebel - de João Gilberto;
E nem B.B., la femme de Serge Gainsbourg;
Nem, de Totó, na malafemmená;
Nem a Iaiá de Zeca Pagodinho;
Nem a mulata mulatinha de Lalá;
E nem a carioca de Vinícius
E nem a tropicana de Alceu
E nem a escurinha de Geraldo
E nem a pastorinha de Noel
E nem a namorada de Carlinhos
E nem a superstar do Tremendão
E nem a malaguenha de Lecuona
E nem a popozuda do Tigrão.

Só você,
Hoje elejo e elogio só você,
Só você,
Que nem você não há nem quem nem quê.

De Haroldo Lobo com Wilson Batista,
De Mário Lago e Ataulfo Alves,
Não canto nem Emília nem Amélia,
Nenhuma tem meus vivas! E meus salves!
E nem Angie, do stone Mick Jagger;
E nem Roxanne, de Sting, do Police;
E nem a mina do mamona Dinho
E nem as mina – pá! - do mano Xiz!
Loira de Hervê e loira do É O Tchan,
Lôra de Gabriel, o Pensador;
Laura de Mercer, Laura de Braguinha,
Laura de Daniel, o trovador;
Ana do Rei e Ana de Djavan,
Ana do outro rei, o do baião
Nenhuma delas hoje cantarei:
Só outra reina no meu coração.

Só você,
Rainha aqui é só você,
Só você,
A musa dentre as musas de A a Z.

Se um dia me surgisse uma moça
Dessas que com seus dotes e seus dons,
Inspira parte dos compositores
Na arte das palavras e dos sons,
Tal como Madallene, de Jacques Brel,
Ou como Madalena, de Martinho;
Ou Mabellene e a sixteen de Chuck Berry,
E a manequim do tímido Paulinho;
Ou como, de Caymmi, a moça prosa
E a musa inspiradora Doralice;
Se me surgisse uma moça dessas.
Confesso que eu talvez não resistisse;
Mas, veja bem, meu bem, minha querida;
Isso seria só por uma vez,
Uma vez só em toda a minha vida!
Ou talvez duas... mas não mais que três...

Só você...
Mais que tudo é só você;
Só você...
As coisas mais queridas você é:

Você pra mim é o sol da minha noite;
É como a rosa, luz de Pixinguinha;
É como a estrela pura aparecida,
A estrela a refulgir, do Poetinha;
Você, ó flor, é como a nuvem calma
No céu da alma de Luiz Vieira;
Você é como a luz do sol da vida
De Steve Wonder, ó minha parceira.
Você é pra mim e o meu amor,
Crescendo como mato em campos vastos,
Mais que a gatinha para Erasmo Carlos;
Mais que a cigana pra Ronaldo bastos;
Mais que a divina dama pra Cartola;
Que a domna pra Ventadorn, Bernart;
Que a honey baby pra Waly Salomão
E a funny valentine pra Lorenz Hart.

Só você,
Mais que tudo e todas, é só você;
Só você,
Que é todas elas juntas num só ser.

(Lenine/Carlos Rennó)

segunda-feira, 22 de março de 2010

"DESAFIO"

O amigo e poeta Jorge Pimenta, do Viagens de Luz e Sombra, lançou-me um desafio que trata-se de um Canto Geral dos sentidos e seus matizes.


Jorge, aceito, sim, confesso que desajeitadamente, mas lisonjeado por ser um dos selecionados, o desafio lançado a mim, e cá estou a triplicar-me em quatro:

4 lugares onde comprar:
__ Livraria Leitura: onde leio mais que compro (geralmente enquanto a musa-esposa namora utensílios de outras utilidades várias, antes de vir folhear comigo meus autores preferidos) e adquiro mais do que pago, quando levo pra casa a fortuna de um livro. Não me canso de ir ao shopping para passear entre as prateleiras que guardam volumes e mais volumes de tijolos feitos de capa e páginas.
__ Supermercado Coelho Diniz: não sei se é o melhor ou o que mais barato vende, mas está localizado mais próximo de casa e tempo também é dinheiro, especialmente para quem tem pouco dinheiro para gastar.
__ Churrasquinho do Kabeça, na Ilha: onde eu e a musa-esposa-poeta-cantora conhecemos um arroz chinês feito na chapa que virou cardápio obrigatório uma vez por semana, além de um pão com linguiça que o poeta Roberto Lima precisa conhecer quando pousar seus pés em Valadares (revisited) de novo.
Ps. o Kabeça é a 'cara' (e o corpo também: altura, óculos, barba...) do compositor baiano Roberto Mendes, que também será convidado a apreciar as especiarias de seu sósia, quando enfim cumprir a promessa de vir trazer um pedacinho de sua Santo Amaro para fazer samba e morada num palco valadarense.
__ Livraria Leitura: outra vez e sempre, sempre outras vezes.

4 cheiros:
__ cheiro de um poema recém-nascido.
__ "O Cheiro de Deus", romance de Roberto Drummond, genial já o título.
__ cheiro do cio, entre o silêncio que grita e a cachoeira que dele brota de líquidos que inundam o nariz de prazer e êxtases.
__ cheiro de loção para abafar o insuportável mau-cheiro da memória, dum verso de Carlos Drummond de Andrade.

4 coisas que me fazem sorrir:
__ o sorriso de uma criança.
__ o sorriso de minha mãe.
__ um aperto de mãos quando é dado com a alma, acusado por uma lágrima interna.
__ um gesto de boa vontade entre as pessoas, quer seja uma ajuda para atravessar a rua; uma moeda num canto difícil do bolso ou bolsa, estendida para facilitar um troco; uma gentileza no trânsito; uma qualquer atitude que desconstrua um muro mas erga uma ponte.

4 blogues a desafiar:
__ "Teatro da Vida", de Lara Amaral.
__ "Mil e Um Poemas", de Assis Freitas.
__ "Amor Feito Poesia", de Maria L. Bózoli.
__ "Afrodite para Maiores", de Luciana P.
(e todos que me visitam sempre, pra minha honraria maior)

*

"Um galo sozinho não tece manhãs."
(João Cabral de Melo Neto)

domingo, 14 de março de 2010

INVERNOUTONO























Lendo um comentário de Jorge Pimenta lá no Primeira Pessoa, sobre um poema de Ruy Belo que trata de tema que quase todos tememos, a morte - "a indesejada das gentes" -, lembrou-se-me uns versos que eu rabiscara em minha tenra adolescência, época em que versejei
bastantemente muito, tendo o assunto fúnebre consoantemente em voga.

Perdido por pertencer a ser meu,
Vive quem sou, arrependido e triste:
Por ter nascido e ainda não morreu.
Mal sabe ele por que afinal existe!

Esse sentimento nele persiste,
A cada manhã banhada de breu.
Nunca haverá um riso que o conquiste,
Crê na alegria com a fé de um ateu.

Só no mistério fia que é esta vida!
Detesta o ócio, escusa toda lida.
Rege-o um destino estranho e obscuro.

Dorme sempre com a esperança acesa,
Despertar morto sobre uma fria mesa.
_ Um sono assim também eu o procuro!

(Pedro Ramúcio)

quarta-feira, 10 de março de 2010

ALFABETANIA

Se algum dia a grande dama do 'drama em música' da Música Popular Brasileira, num lapso de sonho, me pedisse uma canção, como se eu fora um Vander Lee...

Nem precisava pedir
A canção já estava pronta
Muito antes de
O pequeno ponteiro do tempo
Dar o primeiro passo sem fim

Nem precisava sangrar
A canção já estava pronta
Muito embora há
De haver Gilberto Gil ou Gonzaguinha
Pra trazer o verso de lá

Nem precisava sonhar
A canção já estava pronta
Muito mais agora
Quando Fernando Pessoa ecoa
Das cordas mansas de Roberto Mendes

Nem precisava gemer
A canção já estava pronta
Muito mais que
A primeira manhã ao deixar
Alceu Valença tão ao seu alcance

Nem precisava erguer
A canção já estava pronta
Muito além do que
Chico Buarque de Holanda apronta
Com suas rimas primas e desenhos mágicos

Nem precisava do amor
A canção já estava pronta
Muito embora o
Poeta que é poeta jamais nega
O verso que Vinicius de Moraes imortalizou

Nem precisava compor
A canção já estava pronta
Muito além do tom
Que Milton Nascimento
Tornara impossível outra voz revisitar

Nem precisava ousar
A canção já estava pronta
Muito mais ainda
Se Caetano Veloso se nos ilumina
Com sua língua que roça a língua de Noel Rosa

Nem precisava brincar
A canção já estava pronta
Muito mais então
Depois que Guilherme Arantes
Lapidou os diamantes finos da imaginação

Nem precisava saber
A canção já estava pronta
Tomara tão simples
Quanto a modinha mais singela
Que Dorival Caymmi cantava com tanto requinte

Nem precisava sofrer
A canção já estava pronta
Muito embora haja
Djavan na antessala do amor
Mostrando pr'esse pecado o mais sagrado álibi

Nem precisava da cor
A canção já estava pronta
Matiz de todo som
Que Tom Jobim pintou
E espalhou no espelho de todos os pianos

Nem precisava da dor
A canção já estava pronta
Tanto quanto tantas
Compositoras fazem queimar suas fogueiras
E acendem o lado quente do ser

Nem precisava fingir
A canção já estava pronta
Muito antes de
O pequeno ponteiro do tempo
Dar o primeiro passo sem fim

(Pedro Ramúcio)