sábado, 9 de julho de 2011

POETAS DE RESPONSA

A cada poema uma obra-prima!
Assim é, amigos, e sempre o será:
Se quisermos ser poetas de responsa. 

Só com um milagre não se faz um Cristo,
Nem dois mil gols inventam outro Pelé.

(Dedicado a Fernando Pessoa, de tantas "Tabacarias".
Dedicado a Marcantonio, do "Diário Extrovertido", de super"Bangs!")

(Pedro Ramúcio, de cacófatos mil)

quarta-feira, 29 de junho de 2011

NA DOR LIDA DE UM FINGIDOR

13 último, Fernando Pessoa fez 123. Da adolescência, terrrrrrrrrremoto tempo em que comecei a ler o imenso poeta português (que escrevia de pé/e era outro a cada vez), relembro este poeminha guardado na 'parede da memória':

Sempre que leio, escrevo.
Do que li, escrevo o que não li:
O que lesse, lido em mim.
Há pouco lia Fernando Pessoa.

(Dedicado a todos que um dia tiveram
"lágrima nos olhos de ler o Pessoa")

(Pedro Ramúcio)

segunda-feira, 20 de junho de 2011

MÃOS DE MANASSÉS

Adelson Viana e Manassés

Quando Raimundo Fagner era um dos maiores intérpretes da MPB e tinha uma das melhores bandas do Brasil, o cearense Manassés fazia parte desse time e era, sendo-o ainda, um dos maiores craques com um instrumento nas mãos, as cordas partindo diretamente do coração, alado coração de inspirado instrumentista e compositor. Para o grande Manassés de Sousa semeio aqui uns pares de versos (fossem ímpares!) como agradecimento por tanta coisa bela que dele, de lá de Paris, daqui de Fortaleza, para além de Brasília, já pude ouvir.

Eu queria ter mãos de Manassés
Pra moer músicas com meus pés.

Eu queria ter mãos de Manassés
Pra coser líricas com meus pés.

Eu queria ter mãos de Manassés
Pra colher pássaros com meus pés.

Nômade, uma palavra de amor.
Uma palavra de amor, nômade.

Eu queria ter mãos de Manassés
Pra verter mágicas com meus pés.

Eu queria ter mãos de Manassés
Pra tecer sílabas com meus pés.

Eu queria ter mãos de Manassés
Pra deter exércitos com meus pés.

Nômade, uma palavra de amor.
Uma palavra de amor, nômade.

(Dedicado a Roberto Lima, poeta que pinta crônicas
com as tintas de Renoir e Rubem Braga;
Dedicado a Márcia Cristina Lio Magalhães, mineirinha
que virou paulista e está cearense, do blogue "Poetar é Preciso")

(Pedro Ramúcio)

quarta-feira, 1 de junho de 2011

QUALQUER VALIOSA COISA

O que fazer
Quando quero fazer
E não sei o que fazer?
__ Fazer uma canção!

O que dizer
Quando quero dizer
E não sei o que dizer?
__ Dizer um poema!

Breve, leve.
Leve, longo.

E que lembre, de janeiro
A janeiro, a sangue e fogo,
Desesperadamente,
Qualquer valiosa coisa
Do poeta Pablo Neruda.

(Pedro Ramúcio)

sexta-feira, 6 de maio de 2011

FILHO PELA CULATRA













Vim
Dum
Ventre
Quente
Que me
Atirou no
Frio oco
Do mundo.
Somente
Tenho
O consolo
De ser mor-
Tal. Tal
Qual
Um vírus.

(Dirigido a Osama - que não amava ninguém - Bin Laden)

(Pedro Ramúcio)

quarta-feira, 20 de abril de 2011

TINHA UM PÊNALTI

Prometi um poema pro Zico, um dos maiores que a bola já conheceu. Ei-lo, surrupiado ao Drummond: um dos maiores que a palavra já conheceu.

No meio da Copa tinha um pênalti
Tinha um pênalti no meio da Copa*
Tinha um pênalti
No meio da Copa tinha um pênalti

Nunca me esquecerei desse acontecimento
Na lida de minhas chuteiras tão consagradas
Nunca me esquecerei que no meio da Copa
Tinha um pênalti
Tinha um pênalti no meio da Copa
No meio da Copa tinha um pênalti

Mas a vida não se resume a um pênalti
Vai, Zico! ser craque por todo o sempre

*Copa do Mundo de 1986, no México

(Dedicado a AL-Chaer, craque de Goiânia)

(Pedro Ramúcio - perna de pau de Valadares)

quarta-feira, 13 de abril de 2011

"TEATRO DA VIDA"

Porque nem sempre se pode roubar a cena, roubei o título deste poema...

Você vai ao teatro
E depois do terceiro
Ou quarto ato
Depois de o drama
À plateia, exposto
Aplaude com saúde
A tragédia dos outros

(Abram-se as retinas)

(Dedicado a Lara Amaral, do "Teatro da Vida")

(Pedro Ramúcio)

sexta-feira, 1 de abril de 2011

O POETA GARCIA LORCA RESSUSCITA UM INSTANTE

Uns lutam a vida inteira e são inprescindíveis: simples pensar do imprescindível Bertolt Brecht.

Nenhuma aurora trará de volta o poeta
O poeta que se perdeu pelas noites
O poeta que não se rendeu aos açoites
O poeta que não se curvou aos algozes
O poeta que era e tinha mais de mil vozes
O poeta que agora descansa nalguma tarde
Feita para seu poema em forma de fogo
E sangue

Nenhuma tarde ainda que liberta trará de volta
O poeta que se partiu rútilo pelas manhãs
O poeta que pariu rios de águas salgadas e sãs
O poeta que desdenhou a sanha de seus assassinos
O poeta que desenhou nos muros novos destinos
O poeta que agora repousa nalguma noite
Perfeita para seu poema em forma de lodo
E luzes

(Dedicado ao bardo de Braga Jorge Pimenta, que andara lendo Lorca recentemente)

(Pedro Ramúcio)

quarta-feira, 30 de março de 2011

JOSÉ ALENCAR SOBE ÀS NUVENS

Uns passam, outros perpassam nuvens indevassáveis.

Com fé de Alencar,
Mover montanhas.

(Pedro Ramúcio)

segunda-feira, 21 de março de 2011

QUEREM FRÁTRIA

Um é baiano e está lançando o livro com DVD "Sotaque em Pauta - Chula: o canto do Recôncavo baiano", juntamente com Nizaldo Costa.
Outro é mineiro e está às voltas com o projeto "Minha Pátria, Minha Língua", criado juntamente com Carlos Borges, que receberá em abril, para uma rodada boa com o intuito de promover o idioma português - tupiniquin - e a literatura brasileira no exterior, o escritor e romancista gaúcho Luis Fernando Veríssimo, nos EUA.
Eu tenho muito orgulho de ser amigo deles, que aguentam das minhas, coitados.

Tem dois Robertos que fazem morada em meu peito,
No lado esquerdo, onde ambidestro bate o coração.
E cada batida tem o tom de dividida, sino estreito
De uma religião chamada poesia,
Devassa devoção.

Acontece que os dois Robertos, por meu mau feito,
Mas palavra de honra, jamais minha mínima intenção,
Furtaram-se, mútuo assalto, a um abraço deles de direito,
Frustrado encontro, em que, tonto,
Fui de fato o ladrão.

Era pra ser em Belo Horizonte, capital que espreito
Nesta alma minha tão sonhadora, Esquina da Canção.
Roteiro digno de Rossellini, Tertúlia do melhor confeito,
Convidados de prima compondo
Orquestra à ocasião.

Palma de Ouro para o elástico elã de anfitriã
E anfitrião.

Da Bahia viria Roberto Mendes, singullaríssimo sujeito,
Poeta que rima acordes no rio de cordas do seu violão.
Dos Estados Unidos pintou nosso craque cronista eleito
Roberto Lima, mineiro dru-mundo
E suas pétalas na mão.

Tudo pavimentado, chance de nenhum contra-efeito:
É sabido que mineiro não perde o trem; baiano: o avião.
Porém, ah, porém, não se glosa sempre todo proveito,
Sonho é semente que dá flores, frutos, frases,
Filmes ou não.

Meus bons amigos foram se encontrar, eu satisfeito,
Inda que nem mo saibam, no sotaque em pauta da paixão,
Posto que ambos, em ditirambos por nossa pátria e leito,
Lutam por preservar o idioma brasileiro,
Frátria razão.

Precisariam eles, me pergunto, de minha
Prestidigitação?

(Dedicado a Mariana Botelho, autora do livro de poemas
"O Silêncio Tange o Sino", que ainda não li mas já gostei)

(Pedro Ramúcio)

quarta-feira, 16 de março de 2011

TSUNAMIS

Para acordarmos, às vezes, é preciso passar pelo pesadelo.

Pode o que não pode ser,
Pobre a pedra de ouro.
Pode a manhã amanhã nem nascer,
Matam a alma para revender o couro.

Pode o mar não se conter,
E vir bater à sua porta.
Pode o que não pode ser:
Celebram a vida, ainda mais se aborta.

Pode tanto ser tão pouco,
Pode o que não pode ser.
Preso o pássaro solto,
Deixam a lógica aos loucos se perder.

Pode a birra virar ira,
O irmão te fira a bel-prazer.
---------------------------------,
Ah! Pode ser o que não pode ser!

(Dedicado ao poeta e engenheiro Al Chaer, de Goiânia -
Césio-137, nunca mais!
Para a psicóloga e escritora Lígia Paz, de Blumenau in Curitiba pour Manaus -
autora do livro da capa verde "O Segredo Dos Invejáveis")

(Pedro Ramúcio)

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

ATIRE A PRIMEIRA PÉTALA

Ronaldo Fenômeno (ainda sou fã de Reinaldo tanto quanto ou mais) anunciou, no início da semana, oficialmente, o encerramento da carreira profissional, isto é, dependurou as chuteiras de ouro. Zico, outro ícone incontestável do futebol, disse que gostaria de ter jogado com ele, pois o deixaria na cara do gol toda hora, e isso seria uma espécie de multiplicação dos gols. Eu, de minha parte, desejava escrever alguma coisa em homenagem ao maior artilheiro das Copas, mas, no momento, o máximo que consegui foi trazer um poeminha lá do fundo deste pequeno quintal de quimeras, em que cito o menino de Bento Ribeiro que brilhou pelo mundo.

Se o físico Renato Braz sofre de amor
Se o músico Roberto Lima sofre de amor
Se o cantor de ópera, o operário
Pedro Ramúcio sofre fingindo de amor
Se o matemático Wagner Tiso sofre de amor
Se o empresário de moda Renato Russo sofria
De amor

Se o arquiteto Paulinho da Viola sofre de amor
Se o escritor Luís Inácio Lula da Silva sofre de amor
Se o autor de novelas Ronaldo Nazário sofre de amor
Se o economista Arrigo Barnabé sofre de amor
Se o astronauta Sivuca sofria de amor

Se o pastor luterano Roberto Mendes sofre de amor
Se o ecumênico budista Pelé sofre de amor
Se o pintor Marco Van Basten sofre de amor
Se o médico Carlos Drummond de Andrade sofria
De amor

Se o tenista Raimundo Fagner sofre de amor
Se o político (ops!) Gilberto Gil sofre de amor
Se o dançarino Faustão sofre muito de amor

Se o contador de anedotas Geraldo Vandré sofre
Calado de amor

Tudo está no seu lugar, graças a Deus

(Pedro Ramúcio)

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

ANTE O CANTO ANCESTRAL DE FERNANDO BRANT


Amigos, tenho postado pouco. Mas para quebrar o (des)encanto, esta singela homenagem a um dos maiores poetas da canção brasileira:

Ante o canto de Fernando Brant
Eu me encanto bem muito antes
De a primeira sílaba se dar
De o segundo acorde ressoar
Seu canto é ancestral
Ao que a gente se mente
Tão diferente, tão de frente
Pressente nossa vã travessia
Um querer que não nos cabia
Contentamento descontente

Ante o canto de Fernando Brant
Eu me espanto bem muito antes
De a segunda vírgula se dar
De o primeiro verso ressoar
Seu canto é sensual
Alma animal da gente
Tão de frente, tão diferente
Encontra paz na despedida
Um sabor de morte e vida
Severina sorte, San Vicente

(Dedicado a Tadeu Franco, passarim de Itaobim)

(Ramúcio Pêdro)

sábado, 1 de janeiro de 2011

POSE E POSSE

Hoje uma nova página se escreve na história do Brasil. Que a leiamos com duradouro orgulho por longos séculos, torço e terço.

Que obra, manobra de minha alma,
Herdarei como deixada aos leitores
Que me lisonjearão com a lembrança
De meus escritos, meus gritos guardados
Pelos ares?

Que honra, redoma de meu caráter,
Deixarei como herança luminosa,
Sol que não cessará uma noite sequer
De rebrilhar sobre meus gestos
Por meu País?

(Dedicado à Dilma Rousseff, primeira mulher a presidir o Brasil)

(Ramúcio Pedro Coelho)

terça-feira, 30 de novembro de 2010

RIO DESIGUAL

José Carlos Capinam é um poeta baiano que atravessou gerações de parceiros sem jamais perder o requinte de estabelecer com cada criador de melodias sobre (ou sob) seus sempre afinados versos, uma parceria ímpar. Não sei se o homenageio aqui, mas cito-o com muita alegria neste poema que me nasceu ao ouvir na memória uma canção da América dele. Soy loco por ti, Capinam.

Devo sentir que sem ti sou um sofredor

Devo sonhar que sonhar é substituir a dor

Devo saber que saber é se enganar

Devo dizer que calar é consentir sem se contentar

Devo lutar que não lutar é estar sem luz

Devo amar que não amar é carregar de outro jeito a cruz

Devo sorrir que sem sorrir o rio passa desigual

Devo cantar que sem cantar o verbo é um numeral

Devo querer que por querer faço o festival

Devo erguer que ao erguer passo do passional

Devo dispor que por dispor dispo sem desvestir

Devo compor que ao compor pareço que eu vou parir

Devo servir que servir é vir a ser fã do afã do Capinam

Devo ousar que ousar é ouvir ontem o amanhã

Devo perder que perder é fonte de encontrar

Devo temer que temer, pois, são dois a se admirar

Devo chorar que chorar é uma oração sem ajoelhar

Devo orar que orar melhora minha hora de caminhar

Devo pedir que pedir permite que eu ganhe ou não

Devo doar que doar simplesmente faz bem ao meu coração

Devo descrer que descrer desfaz o toldo azul do céu

Devo rever que rever refaz da noite um dia de véu

Devo passar que passar é o recomeço depois do fim

Devo durar que durar é o futuro de pra onde eu vim

Devo cair que cair é medir a altura mais pura de mim

Devo voar que voar é poder visitar a casa de um querubim

Devo tecer que tecer é entreter com o mesmo teor

Devo rimar que rimar é ser poeta mesmo sem um tear

Devo dever que dever é devolver o vaso ao criador

Devo propor que propor é prorrogar o prazo de entregar


(Dedicado ao baiano Roberto Mendes, atual grande parceiro de Capinam)


(Pedro Ramúcio)

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

TERCEIRO ATESTADO DE ÓBITO

Há uns dias soprou-se-me uns versos em intenção de Dali, o poeta das tintas tontas; tantas. Depois de ler "Para um quadro de Dali ou Magritte" do poeta de feiras fartas Assis Freitas, eu prometi a ele (e a mim) que lhe dedicaria o poema que estou pintando em homenagem ao artista catalão. Acontece que as estrofes engarrastanharam, e nem sei quando darei cabo ao rabo de foguete em que me meti: um poema que não quer sair...
Pra aliviar a barra e tentar ganhar tempo para cumprir com minha promessa, trago este poeminha que rabisquei ontem e, por coincidência ou acaso, ou ocasos mais que ocasionais, trata de tema similar à "elegia breve e assustada" com que me deparei há pouco lá no "mil e um poemas" do craque com as palavras Zé de Assis, ou Maradona de Ondina, como o rebatizara outro fera de rara estirpe, nosso amigo Roberto Lima, do "Primeiríssima Pessoa".

Há poemas que são apenas penas de um poeta.
Há outros poemas, porém, que são uma espécie
De ressurreição.


(Dedicado ao poeta de quinhentos mil talheres Assis Freitas)

(Pedro Ramúcio)

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

ESTUDANDO TOM ZÉ



Tom Zé é um zero à direita,
Seja feita sua multiplicação.

Tom Zé é o terceiro olho nu,
Seja feita nossa desmiopização.

(Dedicado a Décio Pignatari, ao cubo. E à receita federal, claro)

(Pedro Ramúcio)

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

ADONIRAN

São Paulo, túmulo do samba? Respondo com Adoniran Barbosa. Precisa mais? Oh! Musa desvairada, delirai.

O que eu faço, se me desfaço toda vez que ouço

Gal cantar o “Trem das Onze”?

O que eu arranjo, se me desarranjo cada vez que manjo

Elis mandar “Tiro ao Álvaro”?


Ah! Adoniran João Rubinato Barbosa,

Nunca vi tanta poesia como em sua prosa!


Ou maior prova de carinho

Que fazer uma aliança

Com a corda Mi do cavaquinho!


(Dedicado a Renato Braz e Samuel de Abreu, paulistas da gema)


(Pedro Ramúcio)

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

"ONZE" ANOS COM E SEM JOÃO CABRAL DE MELO NETO

Em 9 de outubro de 1999 a poezia brazileira perdeu um de seus mestres mundiais de Literatura, João Cabral de Melo Neto.

Em outubro passado, eu postara aqui no Canto Geral uma singela homenagem a esse pernambucano do mundo, após ler, em artigo do craque Alécio Cunha (que faleceria um mês depois, em decorrência de um AVC, na flor dos seus tenros 40 anos de idade), a pouca repercussão, principalmente no Brasil, dos dez anos da morte do autor de "Morte e Vida Severina".
Hoje reposto o poema com que tento, à minha mineira maneira, reverenciar o grande artista do verso que exercia o fazer poético pelo rigor e pela razão, abolida inspiração.

E eu não poderia deixar de dizer da tristeza que também sinto com a perda do grande artesão da palavra que foi Alécio Cunha (com quem eu estreitava laços via e-mails, torcendo virasse amizade; num, ele me respondeu sobre este mesmo poema, seco feito o poeta de "Uma Faca Só Lâmina": "poema bem elaborado").

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Com suor, essa mão
Espalha o pó e o pólen
Do poema inda virgem:
Zangada inspiração.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Essa rima no chão,
Rama que não podem
Desbastar das mãos do Homem,
É rio sem contramão.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Esse rio em questão
Sobe na estiagem.
Pro tempo, qual barragem?
Saudade é inundação.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Esse oceano-sertão
Precisa de drenagem.
Confusa sua paisagem,
Sol e chuva se lavam.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Essa poça, alçapão.
Líquida hospedagem.
Hóspede sem bagagem:
Só o ladrado de um cão.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Esse poço, prisão.
Lodo por toda margem.
Nódoa na mútua imagem:
Os pixels da ilusão.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Esse fosso, fusão.
Fósforo pós-fuligem.
Fóssil sem data; origem.
Cisterna em combustão.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Esse brejo, vulcão.
Sertanejos que fingem.
Violeiros que tingem
De silêncio a canção.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.

Essa gota, erosão.
Água de árida nuvem,
Neve de leve friagem.
Fiado o fio do algodão.

Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.


(Dedicado a Alécio Cunha, in memoriam)

(Pedro Ramúcio)