Citada uma declaração de João Cabral numa postagem anterior, lembro este poema que comecei quando o grande bardo pernambucano partira da lida vertical. Em outubro de 1999 eu apenas escrevi a primeira estrofezinha e a guardei numa gaveta. Agora lendo o grande jornalista mineiro Alécio Cunha citar em seu magnífico blog Ler, Reler, Viver... que a data de dez anos sem Cabral estaria passando sem as merecidas homenagens, principalmente no Brasil, resolvi dar cabo à empreitada empreendida lá atrás. Avante, então:
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Com suor, essa mão
Espalha o pó e o pólen
Do poema inda virgem:
Zangada inspiração.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Essa rima no chão,
Rama que não podem
Desbastar das mãos do Homem,
É um rio sem contramão.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Esse rio em questão
Sobe na estiagem.
Pro tempo, qual barragem?
Saudade é inundação.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Esse oceano-sertão
Precisa de drenagem.
Confusa sua paisagem,
Sol e chuva se lavam.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Essa poça, alçapão.
Líquida hospedagem.
Hóspede sem plumagem:
Só o ladrado de um cão.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Esse poço, prisão.
Lodo por toda margem.
Nódoa na mútua imagem:
Os pixels da ilusão.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Esse fosso, fusão.
Fósforo pós-fuligem.
Fóssil sem data; origem.
Cisterna em combustão.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Esse brejo, vulcão.
Sertanejos que fingem.
Violeiros que tingem
De silêncio a canção.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
Essa gota, erosão.
Água de árida nuvem,
Neve de leve friagem.
Fiado o fio do algodão.
Com pesar, sem João.
Apesar de não sem.
O que vai, vai e vem.
O que há, há e não.
(Pedro Ramúcio)
E agora... Abril
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Acusam-me de Mágoa e Desalento
Carlos de Oliveira
Acusam-me de mágoa e desalento,
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